Por Pedro Blas Gonzalez
Tradução de Tibério Cláudio de Freitas
Comentários de Helkein Filosofia
O homem do Ocidente padece duma radical desorientação, pois não sabe por que estrelas orientar a sua vida.[1]
— Ortega y Gasset
As Raízes da Filosofia de Existência de Ortega y Gasset
Ortega inicia O Tema de Nosso Tempo (El Tema de Nuestro Tiempo) citando a importância do conceito de gerações na história humana, e conclui expondo a percepção que o homem tem da realidade. Esses dois conceitos estão relacionados, dado que uma geração assinala a interação dos pólos individuais e coletivos do homem no mundo. Ortega refere-se a diferentes gerações como variedades da raça humana — isto é o indicativo de sua fidelidade à existência individual em oposição à vida coletiva.
O Tema de Nosso Tempo é uma das primeiras obras de Ortega e contém muitos dos principais temas presentes em seu pensamento tardio. A trajetória de seu pensamento demonstra a importância fundamental desta obra às suas idéias em filosofia da história, na Razão Vital e nas categorias existenciais que influem seu trabalho.
Aqueles que lêem diligentemente a filosofia de Ortega percebem que O Tema de Nosso Tempo estabelece um modo de pensar que é fixado entre: a Razão Vital[2], como uma experiência vivida; e uma cosmovisão positivista, que promete ao homem uma explanação utópica da realidade humana. Estas duas tratam-se de posições metafísicas contrárias que afetam o entendimento humano da contingência. Ortega entendeu o positivismo como um destruidor da capacidade de autorreflexão do homem. Deste modo ele previu com toda a exatidão em muitas das suas obras (incluindo A Rebelião das Massas ), que no século XX passaria a ser a cosmovisão dominante — principalmente por meio da especialização e do desproporcional crescimento do cientificismo em relação à segurança existencial do homem. E assim articula-se a opinião Ortega ao longo de toda a sua obra.
Em Meditações do Quixote (Meditaciones del Quijote), o pensador espanhol investiga o contraste entre a profundidade e a superficialidade: os aspectos latentes e patentes da verdade. O trabalho é uma reflexão existencial a respeito do indivíduo versus o cosmos. Neste trabalho magistral, Ortega explana que “vida individual, o imediato, a circunstância são diversos nomes para a mesma coisa: aquelas porções da vida e onde não se extraiu ainda o espírito que encerram, seu logos.”[3]
O Meditações do Quixote trata do perigo de confundir a floresta com as árvores. Neste trabalho, a profundidade e a superficialidade na realidade humana refere-se à capacidade do homem em distingüir a realidade da aparência. O homem experimenta a vida dinamicamente, mesmo que transparente para si. Ortega argumenta que a verdade confronta os indivíduos como agentes existenciais que buscam por fidelidade com a experiência vivida. Enquanto ele desvia-se dos neologismos e do pedantismo que os filósofos acadêmicos vieram a aceitar no discurso filosófico, a publicação das Meditações do Quixote em 1914 introduz a sua crítica ao hiperracionalismo. Ele receava que o hiperracionalismo estivesse prestamente a tornar-se num substituto da vida biográfica (a existência). Vida biográfica é um dos termos que Ortega usa para descrever o homem como um ser metafísico-existencial: “a erudição ocupa, pois, a periferia da ciência, porque se limita a acumular fatos, ao passo que a filosofia constitui uma aspiração cêntrica, porque é a pura síntese.”[4] Ortega refere-se a essa forma de síntese como conhecimento.
Ainda que muitos leitores saibam o que significa razão e racionalismo na obra de Ortega, a vida biográfica se mantém um tanto obscura; e este é o cerne da qüestão em O Tema de Nosso Tempo. Por 1923, o ano em que O Tema de Nosso Tempo foi publicado, Ortega percebeu que a ciência e o positivismo tentavam explicar o universo, incluindo a vida humana, em termos mecânicos. O pensador espanhol viu que para refrenar a confiança exagerada que muitos pensadores puseram no hiperracionalismo — esta é uma das muitas ironias que Ortega destaca —, é necessário entender a vida humana enquanto biográfica, não como meramente biológica. A vida biográfica é uma categoria existencial[5] que Ortega primeiramente formulou num ensaio publicado em 1910 intitulado como “Adão no Paraíso”, (“Adan en el Paraíso”) e Meditações do Quixote. A vida biográfica é uma fundamental categoria existencial no trabalho de Ortega.
A Idéia da Vida Biográfica
Ao argumentar por uma perspectiva da vida humana como extranatural, isto é, vida que conhece a si mesma como existência (e não mera biologia), Ortega evade-se da tentação de reduzir a vida a um processo bioquímico. O seu pensamento é metafísico-existencial conforme à sua capacidade de relacionar a reflexão filosófica com a antropologia filosófica. Uma maneira de compreender isto dá-se confrontando a realidade humana por meio da experiência vivida dos indivíduos. Exercitando a subtileza e a expressão lírica, Ortega demonstra como o homem acabou por ficar desiludido com as pretensões utópicas do positivismo. Redigindo do início e até os meados do século XX, ele anteviu que essa forma de desilusão eventualmente asfixiaria o homem moderno.
O Tema de Nosso Tempo liga a idéia de gerações como unidades de vida natural dos grupos de idade humana (que são compostos por indivíduos) à sensibilidade vital. Vital é uma outra categoria existencial do pensamento de Ortega. Entender vital como algo biológico, ou como vigor, trata-se duma interpretação inapropriada a respeito do que Ortega quer dizer com vital. Em vez disso, vital é existencial porque reconhece que, com o objetivo de a vida biológica conhecer a si mesma, tem de acordar com sua própria existência por meio da autorreflexão. É um processo que escapa à vida animal e vegetal. Por este motivo, o vital na Razão Vital é a razão que conhece a si mesma como vida diferenciada enquanto ser humano. O sobremencionado é uma operação delicada que não pode ser relegada à teorização, especialmente quando descreve a vida humana em termos coletivos.
A Razão Vital mostra um nível de envolvimento com a realidade humana que não substitui a vida pela razão pura, exempli gratia: o que Ortega considera como a busca pelo hiperracionalismo. É por isto que ele escreve: “Esta que chamaremos por ‘sensibilidade vital’ é o fenômeno primário da história e o primeiro que haveríamos de definir para compreender uma época.”[6] Por isto que ele defende que a história é o resultado de idéias e crenças vividas — como estes que servem de fundação da existência humana individual: “O caráter ativo, criador da personalidade, é, com efeito, demasiado evidente para que se possa aceitar a imagem coletivista da história.”[7]
Reflexão Existencial e Auto-interesse Prático
O enfoque de Ortega na natureza diferenciada, como capaz de autorreflexão e orientada pela vontade, é uma reação ao positivismo. Quando ele diferencia a vida biológica de autoconsciência como um aspecto da interioridade — tal qual no caso em O Tema de Nosso Tempo — ele apenas destaca o óbvio: “A missão do pensamento é refletir o mundo das cousas, se ajustar a elas de um ou outro modo; em suma, pensar é pensar a verdade, tal qual a digestão consiste em assimilar os manjares.”[8]
Ortega desenvolveu um pouco mais da última idéia em A Rebelião das Massas : a idéia do homem, como diferenciado e capaz da autoconsciência, serve como meio para tornar possível a ciência e o positivismo. Este caso é o porquê do Ortega enfatizar que a ciência e o positivismo são modalidades da existência humana. Ele refere-se a muitas das modalidades da vida do homem como afazeres (que hacer). Noutras palavras, vida que se reconhece como extranatural, tal qual no caso do homem: preenche as horas do dia atenuando o assalto das contingências. Embora a vida animal deva atender igualmente às necessidades naturais como comida, abrigo e segurança, não são internalizadas como qüestões existenciais.
Levando como exemplo, quando médicos descrevem as doenças e funções dos rins, fígado e coração, o conhecimento desses órgãos é obtido ao entender que tê-lo, em última análise, trata-se de interesse próprio. É concebível que a ciência médica possa permanecer teórica; apenas interessada em conhecimento por desporto. É também concebível que os astrofísicos estejam meramente interessados nas leis da física como curiosidades matemáticas e teóricas. Até o conhecimento dos padrões meteorológicos da Terra pode entreter como uma forma teórica de “a arte pela arte”. Essas possibilidades podem ser garantidas ao positivismo, mesmo que na sua forma mais radical. Ortega, porém, argumenta que o conhecimento deve trabalhar à serviço da vida. A honestidade intelectual demanda saber por quanto tempo durará a busca do saber pelo saber, isto antes que se inicie o esgotamento teórico e intelectual. O esgotamento sobremencionado acaba por torna-se numa forma de desilusão que mina a compreensão que o homem tem da realidade humana. Este estágio de desilusão naturalmente afeta o homem existencialmente. Mesmo que alguém aceite o saber pelo saber, sem que sirva à vida, como Ortega sugere que o conhecimento deve trabalhar, resta-nos ainda a possibilidade do saber como uma forma de egoísmo e narcisismo. Indubitavelmente o cientificismo e, em parte, a ciência moderna, operam feito cabide empregatício[9] e, por isso, é impossível afastar sua influência do conhecimento científico.
Meditações do Quixote é o livro de sucesso de Ortega, aquele no qual trata da predicação metafísico-existencial do homem. Nesse livro, o pensador espanhol atenta-se a qüestões ontológicas, e o faz sem intelectualizar em demasia, pondo à mostra sua capacidade enquanto pensador e ensaísta. Ortega segue a tradição de pensadores como Erasmo, Montaigne e Pascal: filósofos que possuem o dom de fazer exposições claras e diligentes. Assim, seus livros não bombardeiam o leitor uma epistemologia pedante e insensível, e sua escrita jamais decai nas armadilhas hipotéticas dos filósofos analíticos; por outro lado, seu Meditações investiga qüestões existenciais e evita o malabarismo intelectual. Por este motivo Ortega, a respeito de Comte e outros positivistas, destaca freqüentemente que: “O ideal do século XIX era o realismo. ‘Os fatos, apenas os fatos’, clama o personagem dickensiniano de Tempos difíceis. O como, não o porquê; o fato, não a idéia, predica Augusto Comte.”[10]
O Meditações do Quixote é enganoso; pois, enquanto escreve-se a respeito de Dom Quixote, o pensamento principal de Ortega continua a ser uma reflexão existencial em réplica à existência humana. Ele não se afasta da reflexão sobre a vida enquanto experiência vivida. A vida como experiência vivida e a tragédia como afazer são dois modos de existência humana diferenciada. Esta é uma das razões por que ele se atenta na questão do “por quê?”, pois a principal preocupação de Ortega é ontológica — ele trata do valor da reflexão humana e de como o homem experimenta a realidade enquanto experiência vivida. O Meditações do Quixote é um estudo da interioridade, uma vez que esta é experimentada enquanto experiência vivida.
Ao abster-se de suposições teóricas, a sua descrição do Quixotismo relata a vida como uma resistência à objetividade. Sendo esta uma tarefa solitária que pensadores reflexivos adotam; e isso é também um exemplo de vida biográfica que busca o sublime. Dom Quixote, a magna criação de Cervantes, aborda o homem como um ser extranatural, que reflete sobre a existência humana no mundo objetivo.
Em sua discussão da relação entre a floresta e as árvores na floresta de Escorial (um símbolo de aparência e realidade), Ortega admite que o conhecimento é limitado. Enquanto o homem pode determinar a significação ao envolver-se com as árvores individualizadas, a floresta foge de nós. A vida se caracteriza como autoconsciência individual. É como a Razão Vital, cuja vida pode transcender-se a si própria. Porém, a transcendência não quer dizer envolvimento com a compreensão e verdade absolutas. E também é por isso que Ortega argumenta que a existência individual é única e intransferível. E por fim a necessidade do homem em confrontar a existência individual se transforma n´algo trágico.
A transição de Meditações do Quixote para O Tema de Nosso Tempo identifica os sinais de resistência que o mundo moderno dá contra a vida reflexiva. Enquanto Meditações do Quixote trata da existência individual enquanto experiência vivida, O Tema de Nosso Tempo preocupa-se com a condição do homem no mundo moderno. Por isso a modernidade assemelha-se a uma densa floresta que apenas alimenta o homem com complexidades que escapam à coesão [cohesion].
A começar pel’O Tema de Nosso Tempo, Ortega continuou a desenvolver as suas idéias sobre o homem-massa e o homem nobre; e como exemplo disto, é a descrição de nobres minorias. Da sua discussão sobre a interioridade — que é, em sua essência, a descoberta da natureza da subjetividade pelo homem — Ortega se concentra na predicação da subjetividade no mundo. O homem nobre vive numa existência nobre por enfrentar corajosamente as contingências da vida. E isto pressupõe a compreensão de que a existência humana não pode contar com a vida dos outros para a conquista dum conhecimento coerente da vida biográfica.
Viva pelo propósito de se viver[11]
A vida enquanto circunstância é um componente essencial da subjetividade (interioridade) que Ortega identifica no Meditações do Quixote e na sua obra tardia. A idéia de vida, enquanto uma das circunstâncias que influenciam a existência humana, desempenha um papel fundamental em O Tema de Nosso Tempo. Neste trabalho, Ortega argumenta que as pessoas devem desenvolver a capacidade de adaptação à própria natureza. Determinado em diferentes termos, o homem precisa de se apossar da sua própria escala de possibilidades e limitações. Esta é uma resposta às demandas feitas pela vida ao homem. A aceitação das nossas circunstâncias implica numa reflexão sobre aspectos fundamentais da vida enquanto existência. Em outras palavras — é a privação do sobredito (igualmente ao caso da vida animal), significando uma ignorância das nossas próprias circunstâncias. Este último torna-se num grande problema quando as pessoas fazem comparações as suas respectivas circunstâncias.
O pensamento de Ortega reconhece que a modernidade faz da vida (vivida por si mesma) um desafio nunca antes visto. A tensão entre a vida e os princípios positivistas da modernidade é o componente central de O Tema de Nosso Tempo. A compreensão do racionalismo que Ortega defende faz da modernidade cúmplice do abuso da razão por meio da criação do hiperracionalismo. A forma de razão que Ortega promove deve trabalhar à serviço da vida como experiência vivida. Isto é o que ele quer dizer por Razão Vital.
O problema principal que a modernidade põe para o homem, segundo sugere Ortega em O Tema de Nosso Tempo, é o problema da verdade; deve-se, porém, ter cuidado ao conceber esta antiqüíssima questão filosófica. Ortega não se preocupa com aspectos técnicos de epistemologia, especialmente porque o positivismo a concebe. A epistemologia não é uma questão premente nesse livro; seu foco é a vida como experiência vivida e a capacidade do homem de decifrar a coerência na realidade objetiva. Ortega sugere que a modernidade obnubila a verdade. E isso é trágico, pois a verdade age como uma âncora da capacidade do homem de apossar-se da realidade humana.
No capítulo intitulado “Relativismo e Racionalismo”, Ortega chama a verdade de “problema altamente dramático”. Isto é uma indicação, segundo ele mesmo, que a verdade não é uma qüestão teórica. Por outro lado, “a verdade, se é para ela dar uma reflexão adequada da natureza dos fenômenos, deve ser completa em si mesma e invariável.”[12] Não sendo uma teoria acadêmica, Ortega considera a verdade como destinada a criar segurança para o homem. Segurança é, por fim, um componente essencial da constituição metafísico-existencial do homem. Assim, a verdade torna-se num problema para o homem moderno, não porque é objetiva e difícil de se ter, mas porque o homem moderno a fragmenta ao fazê-la relativa. A relação entre relativismo e racionalismo na modernidade é o foco principal da obra de Ortega; ele pensa no relativismo enquanto cepticismo. O cepticismo, argumenta, é suicida por natureza.
A verdade objetiva, conforme Ortega concebe, é determinada através das suas ideias sobre a perspectiva. Perspectivismo é o entendimento que, enquanto a verdade é objetiva, ela é filtrada através da capacidade individual de determiná-la. Por outro lado, se a verdade objetiva é negada pelos relativistas, então o relativismo não pode ser levado a sério. A sugestão de Ortega é pungente, pois a verdade deve servir como guia para a vida. Dado que a verdade é equivalente à opinião, o homem se perde por conta da incapacidade de salvar as suas circunstâncias. Novamente, devemos enfatizar que a principal preocupação de Ortega é com a vida enquanto experiência vivida, e não com irrelevâncias sobre epistemologia.[13]
O Tema de Nosso Tempo: a Vida Biográfica Contra o Cepticismo Radical
Segundo Ortega, a vida moderna está posta entre o racionalismo (que denuncia a vida), o relativismo e o cepticismo (que denunciam a verdade). Ortega argumenta em O Tema de Nosso Tempo que a modernidade obnubila a vida [vendo-a] através dum espelho[14]: [isto é,] pelo cepticismo radical. Ele acha que o cepticismo destrói a busca do homem pela segurança metafísico-existencial.
Na obra de Ortega, radical significa raiz [root]: a fundação da vida enquanto experiência vivida. A forma de Razão Vital defendida por Ortega serve de sede para a determinação de outros aspectos da realidade humana. A Razão Vital é fundamental e radical por dar ao homem a possibilidade de determinar outros aspectos da verdade. Quando a capacidade do homem de se apropriar da verdade (isto é, de colocá-la à serviço da vida) é corrompida pelo cepticismo radical, a vida vital passa a se desorientar.
Estando longe de cultivar a vida enquanto experiência vivida, Ortega argumenta que o hiperracionalismo e o cepticismo são, para a vida, antiéticos. Apoiando-se em princípios quantitativos e calculistas, o positivismo e o racionalismo (pós-Descartes) impedem a espontaneidade na vida humana. Segundo o filósofo, o racionalismo tenta construir uma ordem racional originada nos princípios quantitativos. Dirá que muitos dos racionalistas cometem o erro de aplicar o racionalismo a todos os aspectos da vida humana. Em O Tema de Nosso Tempo mostra-se muitos exemplos de como a vida moderna é sufocada pelo cientificismo, racionalismo e relativismo. Os exemplos de Ortega são abundantes, pungentes e prescritivos [prescriptive] da pós-modernidade que há de vir. Em O Tema de Nosso Tempo são introduzidas muitas qüestões filosóficas que Ortega posteriormente desenvolveria n’A Rebelião das Massas.
A luta da Razão Vital para manter-se ancorada na vida — e evitar de ser sufocada pelo hiperracionalismo — é a base da obra inteira de Ortega. A Razão Vital é o reconhecimento da vida consciente que é dotada da capacidade de autorreflexão. O autor contrasta a Razão Vital com a intromissão do modernismo na experiência vivida dos indivíduos; e isso lhe permite oferecer uma visão sociopolítica da vida coletiva que demonstra a exaustão do homem moderno como resultado da adoção do hiperracionalismo.
O Tema de Nosso Tempo conclui oferecendo um vislumbre das expectativas sociopolíticas que o positivismo e o hiperracionalismo criaram para o homem no século XX. Ao oferecer um entendimento metafísico-existencial do homem, o autorestabelece a subjetividade (interioridade) como condição existencial extranatural do homem.
Em contraste ao homem como um ser extranatural, Ortega lamenta que o homem moderno se encontre num predicamento sem precedentes de acreditar em si mesmo como mestre da realidade humana. Por sua vez, esta crença equivocada é a raiz dum vasto número de patologias modernas; isto para não falar da pós-modernidade. A análise subtil de Ortega a respeito do homem como um ser metafísico-existencial (um aspecto do seu pensamento que repetidamente é mal-entendido por muitos de seus críticos), oferece-lhe a oportunidade de contribuir para a nossa compreensão da crise da civilização ocidental de hoje.
O Tema de Nosso Tempo é um trabalho agourento que permite aos leitores prescientes de entenderem a origem e o sinistro alcance da desilusão e do esgotamento existencial do homem pós-moderno — aquilo a que Ortega se refere como desmoralização. Ortega desenvolveu ainda mais essa visão pungente do homem em A Rebelião das Massas, é uma obra que expõe as categorias sociopolíticas clichês e enfadadas.
Nota do Editor:
Os trechos de Meditações do Quixote foram substituídos pela versão contida na edição brasileira publicada pela Vide Editorial.
Caso o leitor tenha aprendido algo com nossos textos, favor considerar uma doação, via PIX [real] ou Lightning Network [Bitcoin], no código QR correspondente. Sua contribuição nos motiva a continuar fornecendo filosofia de forma simples, mas não simplificada.
Obras de Ortega y Gasset disponíveis em português
- Meditações do Quixote
- O Que É Filosofia?
- Origem e Epílogo da Filosofia
- Lições de Metafísica
- O Homem e os Outros
- A Desumanização da Arte & Outros Escritos
- Estudos sobre o amor
- Idéias e Crenças
- Ao redor de Galileu: Esquema das Crises Históricas
- Sobre a Razão Histórica
- A Caça e os Touros
- Uma interpretação da história universal
- A Rebelião das Massas
Notas:
[1] José Ortega y Gasset, El Tema de Nuestro Tiempo. (Austral, Editora), 60. [Tradução do original] [N.T.]
[2] Para explicações acerca do raciovitalismo orteguiano, ver Razão Histórica e Razão Vital e o Problema do Conhecimento em Ortega y Gasset. [N.E.]
[3] José Ortega y Gasset, Meditations on Quixote. (New York: W. W. Norton & Company, 1961), 43. [N.T.]
[4] Ortega y Gasset, Meditations on Quixote, 39 [N.T.]
[5] Este tema Orteguiano é de importância capital para o bom entendimento do pensamento de Olavo de Carvalho. Ver o primeiro capítulo de Conhecimento por Presença, O Indivíduo Situado. [N.E.]
[6] Ortega y Gasset, Meditations on Quixote, p.13. A referência correta não foi encontrada nem na versão americana e nem na brasileira. Entraremos em contato com o autor do texto para verificar a procedência da citação. [N.E.]
[7] Ortega y Gasset, Meditations on Quixote, p.14. A referência correta não foi encontrada nem na versão americana e nem na brasileira. Entraremos em contato com o autor do texto para verificar a procedência da citação. [N.E.]
[8] José Ortega y Gasset, El Tema de Nuestro Tiempo. (Austral, Editora), Ortega tem o seguinte a dizer a respeito das gerações: “As variações da sensibilidade que são decisivas na história se apresentam sob a forma de geração. Uma geração não é um punhado de homens egrégios, nem simplesmente uma massa; é como um novo corpo social íntegro, com a sua minoria seleta e sua multidão, que tem sido lançado sobre o âmbito da existência com uma trajetoria vital determinada. A geração, compromisso dinâmico entre massa e indivíduo, é o conceito mais importante da história; e, por assim dizê-lo, a dobradiça sobre a qual executa seus movimentos. ” 11. [Tradução do original] [N.T.]
[9] Tradução aproximada de make-work job. [N.E.]
[10] Ortega y Gasset, Meditations on Quixote, p. 163.
[11] Ortega y Gasset, The Modern Theme, p.74.
[12] Ibid., 28
[13] Ibid., 29. A preocupação de Ortega para com a questão da verdade é de caráter existencial. Ele dá ao homem o papel de advogado da verdade; supondo que é para a verdade servir à existência humana. Ele explana: “Primeiramente, se a verdade não existe, o relativismo não pode levar a si mesmo com seriedade; secundamente, a crença na verdade é um fundamento da vida humana profundamente enraizado. Se removemo-la, a vida é convertida numa absurdidade e numa ilusão. A operação para removê-la é, em si mesma, destituída de senso comum e de valor filosófico. O relativismo é, no fim das contas, cepticismo; e o cepticismo, quando sua justificativa consiste em opor-se a toda teoria especulativa, é, em si mesmo, uma teoria de caráter suicida.”
[14] “through a glass darkly”, expressão que vem do versículo 1 Coríntios 13, 12: “Nós agora vemos (a Deus) como por um espelho, obscuramente[…]”. [N.T.]
Posts Relacionados
-
Guia de Estudo básico para Filosofia Antiga
É unicamente o que procuram aqueles a que chamam filósofos, e a palavra filosofia não…
-
Convite à Filosofia, de Enrico Berti
Por Helkein Filosofia Dois filósofos, talvez os dois maiores filósofos que já teve a…
-
Compilado de Coleções de Filosofia
O estudante de filosofia ama coleções; mas enquanto alguns amam pela estética, e é natural…