Willian James
Tradução por Ramon M. Cogo
“Pensamentos” e “coisas” são nomes de dois tipos de objetos que o senso comum sempre encontrará contrastados e que sempre opor-se-ão um ao outro. A filosofia, refletindo sobre esse contraste, variou, no passado, em suas explicações e pode-se esperar que varie no futuro. Primeiramente, “espírito e matéria” e “alma e corpo” representavam um par de substâncias equipolentes muito semelhantes em peso e interesse[1]. Um dia, porém, Kant minou a alma e trouxe o eu transcendental; desde então, a relação bipolar — [antes alma e corpo] — tem sido muito de seu equilíbrio. O eu transcendental parece, atualmente, representar tudo nos alojamentos racionalistas e quase nada nos alojamentos empiristas. Nas mãos de escritores como Schuppe, Rehmke, Natorp, Münsterberg — ao menos em seus escritos anteriores —, Schubert-Soldern e outros, o princípio espiritual atenua-se em uma completa condição espectral, sendo apenas um nome para o fato de que o “conteúdo” da experiência é conhecido. Este perde forma e atividade pessoais — estas passando para o conteúdo — e torna-se mera Bewußtsein ou Bewußtsein überhaupt, da qual, por direito, nada pode ser dito.
Acredito que a “consciência”, uma vez que tenha evaporado para o estado de pura diafaneidade, está a ponto de desaparecer por completo. É o nome de um não-ser (nonentity) e não tem direito a um lugar entre os primeiros princípios. Aqueles que ainda se prendem a isso estão prendendo-se a um mero eco, um rumor débil deixado para trás pela “alma” desvanecente no ar da filosofia. Durante o último ano, eu li um apanhado de artigos cujos autores pareciam estar a ponto de abandonar a noção de consciência[2], substituindo-a por aquela de uma experiência absoluta e não devida a dois fatores. Mas eles não eram radicais o suficiente, não ousando o suficiente em suas negações. Por cerca de vinte anos eu duvidei da “consciência” como uma entidade, por cerca de sete ou oito anos eu sugeri sua inexistência a meus estudantes, e tentei dar-lhes seu equivalente pragmático nas realidades da experiência. Parece-me ser o momento oportuno para que isso seja exposto e universalmente descartado.
Negar amplamente que a “consciência” exista parece tão absurdo — pois, inegavelmente, “pensamentos” existem — que temo que alguns leitores não me seguirão mais longe. Deixe-me, então, explicar imediatamente que pretendo apenas negar que a palavra represente uma entidade, mas, para insistir mais enfaticamente, que representa uma função. Quero dizer que não existe matéria primordial ou qualidade de ente, em contraste com aquilo de que os objetos materiais são feitos, dos quais são gerados nossos pensamentos; mas há uma função na experiência realizada pelo pensamento, e pela realização desta [experiência] essa qualidade de ente é invocada. Essa função é a “ciência” (knowing)[3]. A “consciência” é supostamente necessária para explicar o fato de que as coisas não apenas são, mas são, ainda, informadas, conhecidas. Quem quer que apague a consciência da sua lista de primeiros princípios deve, ainda, fornecer alguma forma pela qual suas funções são mantidas.
I
Minha tese de que se começarmos com a suposição de que há apenas uma coisa primal ou material no mundo, uma coisa da qual todos as coisas são compostas, chamemos essa coisa de “experiência pura”, então, o conhecer pode facilmente ser explicado como um tipo particular de relação mútua da qual porções da experiência pura participam. A relação em si mesma é uma parte da experiência pura; um de seus “termos” torna-se o sujeito ou portador do conhecimento, o cognoscente[4], o outro torna-se o objeto conhecido. Isso precisará de muita explicação antes que possa ser entendido. A melhor maneira de fazer com que seja compreendido é contrastá-lo com sua versão alternativa e, para tanto, podemos usar a mais recente, na qual o desvanecer da substância-alma anteriormente definida foi tão longe quanto poderia sem ainda estar completo. Se o neokantismo expulsou formas anteriores de dualismo, teremos expulsado todas as formas se formos capazes de expulsar, por seu turno, o neokantismo.
Para os pensadores que chamo de neokantianos, a palavra consciência (consciousness), hoje, não faz mais do que sinalizar o fato de que a experiência é irremediável e estruturalmente dualista. Isso significa que nem sujeito, nem objeto, mas objeto-mais-sujeito é o mínimo que pode realmente ser. A distinção entre sujeito-objeto enquanto isso é inteiramente diferente daquela entre mente e matéria, daquela entre corpo e alma. Almas eram destacáveis, possuíam destinos separados; coisas podiam acontecer a elas. Para a consciência como tal nada pode acontecer, pois, sendo atemporal, é apenas uma testemunha dos acontecimentos no tempo, no qual não desempenha nenhum papel. Em poucas palavras, é apenas o correlativo lógico de “conteúdo” em uma Experiência cuja peculiaridade é que o fato vem a luz nesta, que a consciência (awareness) de conteúdo acontece[5]. A consciência (consciousness) como tal é inteiramente impessoal — o “eu” (self) [6] e suas atividades pertencem ao conteúdo. Dizer que sou autoconsciente, ou consciente de aplicar volição, significa apenas que certos conteúdos, para os quais o “eu” e “força de vontade” são nomes, não estão sem testemunhas enquanto ocorrem.
Portanto, para esses morosos bebedores da fonte kantiana, nós teríamos que admitir a consciência (consciouness) como uma necessidade “epistemológica”, ainda que não tenhamos evidência direta de que esteja lá.
Além disso, praticamente qualquer um supõe ter uma consciência imediata da consciência mesma. Quando o mundo dos fatos exteriores cessa de ser materialmente presente, e nós meramente o rememoramos, ou o fantasiamos, acredita-se que a consciência está destacada e é sentida como um tipo de fluxo interno impalpável, o qual, uma vez conhecido nesse tipo de experiência, pode igualmente ser detectado nas apresentações do mundo externo. “No momento em que tentamos fixar nossa atenção sobre a consciência e ver o que, distintamente, esta é” diz um escritor recente, “ela parece esvair-se. É como se tivéssemos ante nós o mero vazio. Quando tentamos introspectar a sensação de azul, tudo que podemos ver é o azul; o outro elemento é como se fosse diáfano. No entanto, pode ser distinguido, se olharmos com atenção suficiente e sabermos que há algo para o qual olhar”[7]. A “consciência” (Bewusstheit), diz Paul Natorp, “é inexplicável e dificilmente descritível, contudo, todas as experiências conscientes tem em comum que o que nós chamamos de seu conteúdo tem essa referência peculiar a um centro chamado “eu” (self), em virtude do qual, sozinho, o conteúdo é subjetivamente dado, ou aparece… Enquanto, deste modo, a consciência, ou referência a um eu (self), é a única coisa que distingue o conteúdo consciente de qualquer tipo de coisa que possa estar lá sem que ninguém esteja consciente disso; no entanto, este único fundamento da distinção desafia toda explicação mais próxima. A existência da consciência, ainda que seja o fato fundamental da psicologia, pode, realmente, ser estabelecida como certa, pode ser trazida pela análise, mas não pode ser definida nem deduzida de nada além de si mesma”[8].
“Pode ser trazida pela análise”, diz o autor. Isto supõe que a consciência seja um elemento, momento, fator — chame do que quiser — de uma experiência de constituição interna essencialmente dualística, a partir da qual, se você abstrair o conteúdo, a consciência permanecerá revelada a seus próprios olhos. A experiência, neste sentido, seria muito parecida com uma pintura feita a partir das imagens do mundo[9].
A pintura tem uma constituição dupla, envolvendo, realmente, um mênstruo (menstruum)[10] e uma massa de conteúdo na forma de pigmento suspenso nele. Podemos obter o mênstruo puro deixando o pigmento secar e o pigmento puro derramando a cola ou óleo. Nós operamos aqui por subtração física; e a visão usual é que, por subtração mental nós podemos separar os dois fatores da experiência de forma análoga — não isolando-os inteiramente, mas distinguindo-os o suficiente para saber que são dois.
II
Minha argumentação, agora, é o exato oposto disso. A experiência, acredito, não tem qualquer duplicidade interna; e sua separação em consciência e conteúdo vem, não por meio de subtração, mas por meio de adição — a adição, de outros conjuntos de experiências, a uma dada parte concreta desta, junto ao que define separadamente seu uso ou função pode ser de dois tipos distintos. A tinta também servirá aqui como ilustração. Esta, em um pote, numa oficina de pintura, junto a outras tintas, serve em sua totalidade como matéria aceitável. Espalhada sobre a tela de pintura, com outras tintas ao redor, representa, ao contrário, uma característica numa pintura e realiza uma função espiritual. Só então, sustento, uma dada porção indivisa da experiência, tomada em um contexto de associados, faz o papel de cognoscente, de estado de espírito, de “consciência”; enquanto, num contexto diferente, o mesmo pedaço de experiência indivisa tem o papel de coisa conhecida, de um “conteúdo” objetivo. Em poucas palavras, num grupo aparece como pensamento e noutro grupo, como coisa. E, na medida que aparece em ambos os grupos simultaneamente, nós temos todo direito de falar sobre isso como sendo, ao mesmo tempo, tanto subjetivo, quanto objetivo. O dualismo conotado por termos ambíguos como “experiencia”, “fenômeno”, “dado” (datum), “Vorfindung” — termos que, pelo menos em filosofia, tendem mais e mais a serem substituídos por termos ambíguos como “pensamento” e “coisa” — ainda está preservado nessa descrição, mas reinterpretado, de modo que, em vez de ser misterioso e elusivo, torna-se verificável e concreto. É um caso de relações que tende para fora e não para dentro[11] da única experiência considerada, e sempre pode ser particularizada e definida.
A brecha para uma maneira mais concreta de entender o dualismo foi cunhada por Locke quando este fez com que a palavra “ideia” não diferenciasse coisa e pensamento, e por Berkeley, quando disse que o senso comum, significado por realidades, é exatamente o que o filósofo quer dizer com ideias. Nem Locke nem Berkeley pensaram suas verdades de forma perfeitamente clara, mas parece-me que a concepção que estou defendendo faz um pouco mais do que cumprir consistentemente o método “pragmático” inaugurado por eles.
Se o leitor fizer uso de suas próprias experiências, verá o que quero dizer. Deixe-o começar com uma experiência perceptiva, a “representação”, assim chamada, de um objeto físico, em seu atual campo de visão, o quarto em que está sentado, com o livro que está lendo como seu centro; e deixe-o, por enquanto, tratar este objeto complexo pela via do senso comum, como sendo “realmente” o que parece ser, a saber, uma coleção de coisas físicas recortadas de um mundo de outras coisas físicas circundantes com as quais estas coisas físicas têm relações atuais ou potenciais. Agora, ao mesmo tempo, são apenas aquelas mesmíssimas coisas que sua mente, como dizemos, percebe; e toda filosofia da percepção decorrida na época de Demócrito foi meramente uma longa disputa sobre o paradoxo no qual o que é evidentemente uma realidade deve ser em dois lugares ao mesmo tempo, ambos no espaço externo e na mente da pessoa[12]. Teorias “representativas” da percepção evitam o paradoxo lógico, mas, por outro lado, violam o sentido da vida do leitor, que não sabe de qualquer imagem mental interferente, mas parece ver o quarto e o livro imediatamente como eles existem fisicamente.
O enigma de como aquele único e mesmo quarto pode estar em dois lugares ao mesmo tempo está no fundo do enigma, da mesma forma que um mesmo ponto idêntico pode estar em duas linhas. E o pode, se situado numa intersecção; de forma similar, se a “experiência pura” do quarto fosse um lugar de intersecção de dois processos, os quais o conectassem com diferentes grupos de associados respectivamente, poderia ser contado duas vezes, como pertencente a cada grupo, e dito, de forma vaga, como existente em dois lugares, ainda que permanecesse, o tempo todo, um único objeto.
Bem, a experiência é um membro de diversos processos que podem ser seguidos por vias inteiramente diversas. Aquela coisa idêntica a si mesma tem tantas relações com o resto da experiência que você pode tomá-la em sistemas de associação díspares, e tratá-la como pertencente a contextos opostos. Em um desses contextos a coisa é seu “horizonte de consciência”, noutro, “o quarto no qual você senta” e a coisa idêntica entra em ambos os contextos totalmente, sem dar qualquer pretexto para que se possa dizer que liga-se à consciência por uma parte ou aspecto e a realidade externa por outro. Quais são, então, os dois processos nos quais o quarto-da-experiência entra, desse modo, simultaneamente?
Um deles é a biografia pessoal do leitor, o outro, a história da casa, da qual o quarto faz parte. A representação, a experiência, aquilo, em resumo, (pois, até que tenhamos decidido o que isto é, deve ser um mero aquilo) é o último termo da corrente de sensações, emoções, decisões, movimentos, classificações, expectativas etc. terminando no presente; e o primeiro termo de uma série similar de operações “internas” estendendo-se para o futuro, da parte do leitor. Por outro lado, o mesmo aquilo é o terminus ad quem de uma variedade de operações físicas de carpintaria, embrulho, mobília, sova etc.; e o terminus a quo[13] o é de uma variedade futura, à qual dirá respeito ao submeter-se ao destino de um quarto físico. As operações físicas e mentais formam grupos curiosamente incompatíveis. Enquanto quarto, a experiência ocupou aquele local e teve aquele ambiente por trinta anos. Como horizonte de consciência, talvez nunca tenha existido até o momento. Enquanto quarto, a atenção continuará a descobrir infindáveis novos detalhes nele. Enquanto mero estado mental, poucos detalhes novos emergirão sob a atenção de seus olhos. Enquanto quarto, precisará de um terremoto ou uma gangue de homens, e em qualquer caso uma certa quantidade de tempo, para destruí-lo. Enquanto estado subjetivo, o fechar de olhos, ou qualquer movimento instantâneo da imaginação será suficiente. No mundo real, o fogo irá consumi-lo. Na mente, pode deixar o fogo brincar nele sem qualquer efeito. Enquanto objeto externo, você deve gastar bem mais de um mês para habitá-lo. Enquanto conteúdo interno, você pode ocupá-lo de graça por qualquer período de tempo. Se, em resumo, você seguir na direção mental, tomando [o quarto] junto de eventos exclusivos de sua biografia pessoal, todos os tipos de coisas [subjetivas] são verdades em relação àquelas que são [objetivamente] falsas, e, [em sentido contrário], falsas em relação às que são [objetivamente] verdadeiras se tratá-las como uma coisa real experienciada, seguir na direção física, e relacioná-las a associados no mundo externo[14].
III
Até agora, tudo parece tranquilo, mas minha tese provavelmente tornar-se-á menos plausível ao leitor na medida em que eu passar das percepções aos conceitos ou do caso das coisas representadas ao das coisas remotas. Acredito, no entanto, que, também aqui, a mesma lei é válida. Se tomarmos variedades conceituais ou memórias ou fantasias, elas são, também, em sua primeira intenção, meros pedaços da experiência pura, e, como tais, são aquilos unitários que atuam, num contexto, como objetos e, noutro, figuram como estados mentais. Por tomá-los em sua primeira intenção quero dizer ignorar sua relação com possíveis experiências perceptivas com as quais talvez estejam conectados, às quais elas possam conduzir e onde possam se encerrar, e, as quais, então, elas possam supostamente “representar”. Tomando-os deste primeiro modo, confinamos o problema a um monte de meros “pensados” e não sentidos ou não vistos diretamente. Este mundo, assim como o mundo das percepções, vem a nós, primeiramente, como um caos de experiências, mas linhas de ordem são logo traçadas. Achamos que qualquer parte disso, que podemos recortar como um exemplo, é conectada a grupos distintos de associados, assim como nossas experiências perceptivas o são; que esses associados se ligam com isso por relações distintas[15]; e que um forma a história interna de uma pessoa enquanto o outro atua como um mundo “objetivo” impessoal, tanto espacial, quanto temporal, ou, senão, meramente lógico e matemático ou, senão, “ideal”.
O primeiro obstáculo, da parte do leitor, para ver que essas experiências não perceptíveis possuem objetividade ou subjetividade provavelmente será devido a intrusão, em sua mente, de percepções que possuem relações e, as quais, como um todo, elas “representam”, permanecendo para elas como os pensamentos para as coisas. Essa função importante das experiências não perceptíveis complica a questão e a confunde; de modo que estamos tão acostumados a tratar as percepções como a única realidade genuína que, a menos que as mantenhamos fora da discussão, nós tendemos a negligenciar a objetividade que reside nas experiências não perceptíveis por si mesmas. Nós as tratamos, percepções do “saber” enquanto tal, como que por meio do subjetivo e dizemos que são totalmente constituídas da coisa chamada consciência, usando este termo agora para um tipo de entidade, o qual, de certo modo, estou buscando refutar[16].
Abstraindo-as, então, das percepções como um todo, o que mantenho é que qualquer experiência não perceptível tende a ser contada duas vezes, assim como o são as experiências perceptíveis, figurando em um contexto como um objeto ou campo de objetos e em outro como o estado da mente: e tudo isso sem a menor autopartição (self-diremption) interna, em suas próprias partes, entre consciência e conteúdo. É tudo consciência por um lado e, por outro, tudo é conteúdo.
Encontro essa objetividade das experiências não perceptíveis, esse paralelismo completo no ponto da realidade entre o atualmente sentido e o remotamente pensado, tão bem colocada nas páginas do “Grundzüge” de Münsterberg, que citarei diretamente.
“Só posso pensar em meus objetos”, diz o Professor Münsterberg; “contudo, em meu pensamento vivo eles permanecem ante mim exatamente como o fariam objetos percebidos, não importando quão diferentes as duas maneiras de apreendê-los sejam em sua gênese. O livro que aqui repousa sobre a mesa ante mim e o livro no quarto ao lado o qual eu penso e o qual pretendo pegar são, no mesmo sentido, realidades dadas a mim, realidades que reconheço e das quais me dou conta. Se concordar que o objeto da percepção não é uma ideia dentro de mim, mas que percepção e coisa, como indistintamente uma, são realmente experienciadas lá, do lado de fora, você não deveria crer que o mero objeto pensado está escondido dentro do sujeito pensante. O objeto no qual penso e de cuja existência tomo conhecimento sem deixar com que interfira em meus sentidos ocupa seu lugar definitivo no mundo externo tanto quanto o objeto que vejo diretamente”.
“O que é verdade sobre o aqui e o acolá é também verdade sobre o agora e o depois. Sei sobre a coisa que está presente e é percebida, mas também sei sobre a coisa que foi ontem e, porém, não é mais, da qual apenas me recordo. Ambas podem determinar minha conduta presente, ambas são parte da realidade da qual me dou conta. É verdade que estou incerto sobre muito do passado, exatamente como estou incerto sobre muito do presente, se este for vagamente percebido. Mas o intervalo de tempo, em princípio, não altera minha relação com o objeto, não o transforma de um objeto conhecido a um estado mental. […] As coisas, aqui, nessa sala que examino e as coisas que estão distantes, na minha casa, e nas quais eu penso; as coisas desse instante e aquelas da minha meninice há muito desaparecida me influenciam e convencem de formas parecidas, a partir de uma realidade que sinto diretamente devido a experiência que tenho delas. As duas compõe o meu mundo real, fazem-no diretamente, não precisa ser apresentado primeiro e mediado por ideias que surgem agora dentro de mim. […] Este personagem não-eu, de minhas recordações e expectativas, não implica que os objetos externos dos quais estou ciente deveriam, necessariamente, estar lá para os outros. Os objetos de sonhadores e pessoas com alucinações são totalmente sem validade geral. Mas, ainda que fossem centauros ou montanhas de ouro, estariam “lá fora”, no reino das fadas e não “dentro” de nós”[17].
Esta é, certamente, a maneira imediata, primária, ingênua ou prática de tomarmos nosso mundo “pensado”. Não havia, ali, um mundo de percepção para servir como seu “redutivo”, no sentido de Taine[18], por ser “mais forte” e mais genuinamente “externo” (de modo que o mundo meramente pensado parece fraco e interno em comparação), nosso mundo de pensamentos seria o único mundo e gozaria da realidade completa em nossa crença. Isso acontece efetivamente em nossos sonhos e em nossos devaneios, contanto que as percepções não os interrompam.
Ainda, — voltando ao nosso exemplo anterior — assim como o quarto observado é também um horizonte de consciência, então, o quarto concebido ou rememorado é também um estado mental; e a duplicação (doubling-up)[19] da experiência tem, em ambos os casos, um fundamento semelhante.
O quarto pensado, a saber, possui muitas associações (coupling)[20] pensadas com outras coisas pensadas. Algumas dessas associações são inconstantes, outras são estáveis. Na história pessoal do leitor o quarto ocupa uma única data — ele o viu uma única vez, talvez, um ano atrás. Quanto a história da casa, por outro lado, esta compõe um ingrediente permanente. Algumas associações possuem a curiosa obstinação dos fatos (stubbornness of fact), emprestando o termo de Royce[21]; outras mostram a fluidez da fantasia — deixamos que venham e que se vão da forma que quisermos. Agrupado ao resto de sua casa, nome de sua cidade, seu dono, construtor, valor e plano decorativo o quarto mantém uma base definida, para a qual, se tentarmos afrouxá-la, ele tende a voltar e a reafirmar-se com força[22]. Para estes associados há, numa palavra, coerência, enquanto para outras casas, outras cidades, outros donos etc. o quarto não demonstra qualquer tendência em associar-se. As duas coleções, a primeira de coesos, e, a segunda, de associados lassos, vêm, inevitavelmente, a ser contrastados. Chamamos a primeira coleção de sistema das realidades externas, no centro da qual o quarto, como “real”, existe; a outra chamamos de fluxo de nosso pensamento interno, no qual, como uma “imagem mental”, o quarto flutua por um momento[23]. O quarto é, portanto, contado duas vezes. Possui duas funções diferentes, sendo Gedanke e Gedachtes, o pensamento sobre um objeto e o objeto pensado, ambos em um; e tudo isso, sem paradoxo ou mistério, da mesma forma que a coisa material, podem ser ambos baixo e alto ou pequeno e grande ou mal e bom, devido a suas relações com partes opostas de um mundo circundante.
Enquanto “subjetiva” dizemos que a experiência representa; enquanto “objetiva” esta é representada. O que representa e o que é representado é, aqui, numericamente o mesmo; porém, devemos lembrar que nenhum dualismo do ente representado e representando reside na experiência per se. Em seu estado puro ou quando isolada não há autoparticionamento desta em consciência e no “de que” a consciência é[24]. Sua subjetividade e objetividade são exclusivamente atributos funcionais, realizados tão somente quando a experiência é “tomada”, i. e., mencionada em dobro, considerada juntamente de seus dois diferentes contextos respectivamente, por meio de uma nova experiência retrospectiva, da qual toda aquela complicação anterior forma, agora, o conteúdo fresco.
O campo instantâneo do presente é o que chamo a todo momento de experiência “pura”. Esta é, até o momento, somente virtual ou potencialmente, tanto sujeito quanto objeto. Por enquanto, é uma atualidade ou existência evidente e não qualificada, um simples isso. Nesse imediatismo ingênuo isso, de fato, é válido; está lá, agimos sobre ele; e o duplicar-se desta, em retrospecto, num estado da mente e numa realidade intencional é, assim, apenas um dos atos. O “estado mental” tratado primeiramente como tal na retrospecção, permanecerá correto ou confirmado, e a experiência retrospectiva, por sua vez, terá um tratamento similar; mas a experiência imediata, em sua passagem, é sempre “verdade”[25], verdade prática, algo para agir sobre, em seu próprio movimento. Se o mundo estivesse, ali mesmo e naquele momento, a se extinguir como uma vela, permaneceria uma verdade absoluta e objetiva, pois seria “a última palavra”, não haveria crítica e ninguém jamais iria opor o pensamento disso à realidade intencionada[26].
Penso, agora, poder afirmar ter deixado minha tese clara. A consciência conota um tipo de relação externa, e não denota uma coisa especial ou uma maneira de ser. A peculiaridade de nossas experiencias, de que elas não apenas são, mas são conhecidas, a qual sua qualidade “consciente” é invocada para explicar, é melhor explicada por suas relações — sendo as relações mesmas experiências — umas com as outras.
IV
Caso fosse tratado agora do saber dos perceptíveis a partir de experiencias conceituais, provar-se-ia ser um caso de relações externas. Uma experiência seria o cognoscente e outra a realidade conhecida; e poderia definir perfeitamente, sem a noção de “consciência”, ao que o saber, atualmente e praticamente, equivale — a saber, a um processo, tendo como fim percepções, por meio de uma série de experiências transicionais que o mundo fornece. Mas não tratarei disso, devido ao espaço insuficiente.[27] Irei, por outro lado, considerar algumas objeções que certamente serão levantadas contra a teoria toda tal como está.
V
Primeiramente, será perguntado: “se a experiência não tem uma existência “consciente”, se não é parcialmente composta de “consciência”, de que então é feita? Matéria sabemos, pensamento sabemos, e conteúdo consciente sabemos, mas “experiência pura”, neutra e simples é algo que não sabemos. Diga de que ela consiste — pois deve consistir de algo — ou esteja disposto a desistir!”.
A resposta a esse desafio é fácil. Ainda que pelo bem da fluência eu tenha anteriormente falado nesse artigo de uma coisa da experiencia pura, devo dizer agora que não há uma coisa geral da qual a experiência é amplamente feita. Há tantas coisas quanto há “naturezas” nas coisas experienciadas. Se perguntar de que qualquer parte da experiência pura é feita, a resposta será sempre a mesma: “É feito daquilo, do que aparece, do espaço, da intensidade, do nivelamento, do acastanhado, da densidade, ou tudo o mais. A análise de Shadworth Hodgson não deixa, aqui, nada a desejar[28]. A experiência é apenas um nome coletivo para todas essas naturezas sensíveis, e, salvo o espaço e o tempo (e, se quiser, o “ser”), não parece haver um elemento universal do qual todas as coisas são feitas.
VI
A próxima objeção é mais formidável, em verdade ela soa um tanto ameaçadora quando é ouvida.
“Se esse for aquele mesmo pedaço de experiência pura, tomado duas vezes, que agora serve tanto como pensamento quanto como coisa” — e, então, a objeção é efetuada — “como é que seus atributos poderiam diferir de forma tão fundamental tomados dessas duas formas. Enquanto coisa, a experiência é extensão; enquanto pensamento, não ocupa espaço ou lugar. Enquanto coisa, é vermelha, dura, pesada; mas quem já ouviu falar de um pensamento vermelho, duro ou pesado? No entanto, agora mesmo você disse que uma experiência é feita daquilo que apenas aparece, e o que aparece é um desses adjetivos. Como pode a experiência em sua função-coisa ser feita deles, consistir deles, carregá-los como seus próprios atributos, enquanto em sua função-pensamento ela os desapropria e os atribui a outro lugar. Há, aqui, uma autocontradição a partir da qual o dualismo radical do pensamento e coisa é a única verdade que pode nos salvar. Apenas se o pensamento for um tipo de entidade é que os adjetivos podem existir nele “intencionalmente” (para usar o termo escolástico); apenas se a coisa for de outro tipo, eles podem existir nele constitutiva e energicamente. Nenhum sujeito simples pode tomar os mesmos adjetivos e, num momento, ser qualificado por eles e, em outro, ser meramente “deles”, como de algo apenas significado ou conhecido”.
A solução na qual esse opositor insistiu, como muitas outras soluções do senso-comum, torna-se tanto menos satisfatória quanto mais se pensa nela. Para começar, são pensamento e coisa tão heterogêneos como comumente se diz?
Ninguém nega que ambos possuem categorias em comum. Suas relações com o tempo são idênticas. Ambos, além disso, podem ter partes (pois os psicólogos em geral tratam os pensamentos como as possuindo); e ambos podem ser complexos ou simples. Ambos são de vários tipos, podendo ser comparados, adicionados, subtraídos e arranjados em séries ordenadas. Todos os tipos de adjetivos qualificam nossos pensamentos, os quais parecem incompatíveis com a consciência, sendo, como tal, uma diafaneidade nua. Por exemplo, são naturais e fáceis ou trabalhosos. São belos, felizes, intensos, interessantes, sensatos, estúpidos, focais, marginais, insípidos, confusos, vagos, precisos, racionais, casuais, gerais, particulares, e muitas outras coisas além dessas. Além disso, os capítulos sobre “Percepção” nos livros de psicologia estão cheios de fatos que contribuem para a homogeneidade essencial do pensamento com a coisa. Como, se “sujeito” e “objeto” estão separados “por todo diâmetro do ser”, e não possuem atributos em comum, pode ser tão difícil dizer, de um objeto material presente e reconhecido, qual parte entra pelos órgãos dos sentidos e qual parte “sai da cabeça de alguém”? As sensações e ideias aperceptivas aqui estão tão intimamente fusionadas que não se pode mais dizer onde uma começa e a outra termina, então você pode dizer, como naqueles panoramas astutos que foram recentemente apresentados, onde o primeiro plano real e tela pintada se unem[29].
Descartes, pela primeira vez, definiu o pensamento como absolutamente inextenso, e os filósofos posteriores aceitaram a descrição como correta. Mas o que isso possivelmente significa para se dizer que, quando pensamos numa régua ou num metro quadrado, a extensão não é atribuível ao nosso pensamento? Para todo objeto que possui extensão a imagem mental adequada deve possuir toda extensão do objeto em si mesma.
A diferença entre a extensão objetiva e subjetiva é, somente, de relação à um contexto. Na mente as várias extensões não mantém, necessariamente, uma ordem inflexível em relação umas às outras, enquanto no mundo físico elas ligam-se umas às outras de forma estável, e, colocadas juntas, fazem a grande Unidade envolvente na qual cremos e a qual chamamos de Espaço real. Como “externa”, eles carregam-se a si mesmas adversamente, por assim dizer, de uma a outra, excluem uma a outra e mantém suas distancias, enquanto como “interna” sua ordem é frouxa, e elas formam uma durcheinander na qual a unidade é perdida[30]. Mas, para argumentar contra isso, que experiencia interior é absolutamente inextensiva parece-me um tanto absurdo. Os dois mundos diferem, não pela presença ou ausência de extensão, mas pelas relações das extensões que existem em ambos os mundos.
Este caso da extensão não nos coloca agora no caminho da verdade no que diz respeito às outras qualidades? O faz; e fico surpreso que esses fatos não tenham sido percebidos muito tempo antes. Por que, por exemplo, chamamos um fogo de quente, e água de molhada. E ainda nos recusamos a dizer que nosso estado mental, quando é “desses” objetos, é ou quente ou molhado? “Intencionalidade”, de qualquer forma, e quando o estado mental é uma imagem vivida, calor e umidade estão nela tanto quanto na experiência física. A razão para isto é que como o caos geral de todas as nossas experiências é filtrado, descobrimos que há fogos que sempre irão queimar gravetos e aquecer nossos corpos, e que sempre haverá alguma água para apagar o fogo; enquanto há outros fogos e águas que não atuarão de qualquer modo. O grupo geral de experiências que atuam, que não apenas possuem suas naturezas de forma intrínseca, mas as vestem adjetiva e energicamente, virando-as umas contra as outras, vêm inevitavelmente a ser contrastado com o grupo cujos membros, possuidores de natureza idêntica, falham em manifestarem-se de forma “enérgica”. Faço agora, comigo mesmo, uma experiência de acender uma chama; coloca-a próxima a meu corpo; mas esta não me aquece nem um pouco. Jogo um graveto sobre ela, e este ou queima ou permanece verde, como eu quiser. Eu convoco a água, e despejo-a no fogo, e não se dá nenhuma diferença. Eu explico todos esses fatos chamando-os de uma série de experiências irreais, uma série mental. Fogo mental é o que não queimará varetas reais; água mental é o que não irá necessariamente (embora é claro que possa) apagar mesmo um fogo mental. Facas mentais podem ser afiadas, mas não cortarão madeira real. Triângulos mentais são pontiagudos, mas suas pontas não irão ferir. Com objetos “reais”, pelo contrário, as consequências sempre se dão; e, assim, as experiências reais são separadas das mentais, as coisas de nosso pensamento sobre elas, fantasiosos ou verdadeiros, e precipitadas juntas como a parte estável de toda experiência-caos, sob o nome de mundo físico. Nossas experiências perceptíveis são o núcleo disso, sendo as experiências originalmente fortes. Adicionamos a elas muitas experiências conceituais, fazendo isso forte também na imaginação, e construindo as partes mais remotas do mundo físico por meio delas; e em torno desse cerne de realidade o mundo de fantasias frouxamente conectadas e meros objetos rapsódicos flutuam como um monte de nuvens. Nas nuvens, todos os tipos de regras são violadas, as quais são mantidas no cerne. Lá, as extensões podem ser alocadas indefinidamente; lá, o movimento não obedece às leis de Newton.
VII
Há uma classe peculiar de experiências para as quais, tomadas como subjetivas ou como objetivas, nós nomeamos (assign) suas muitas naturezas como atributos, pois em ambos os contextos eles afetam seus associados ativamente, embora nem tão “fortemente” ou de forma tão afiada como as coisas afetam umas às outras por meio de suas energias físicas. Refiro-me aqui às apreciações, que formam uma esfera ambígua do ser, pertencendo à emoção por um lado e possuindo “valor” objetivo por outro, ainda não parecendo nem muito interno e nem muito externo, como se um particionamento tivesse sido iniciado, mas não se completasse.
Experiências de objetos dolorosos, por exemplo, geralmente também são experiências dolorosas; percepções de amabilidade ou feiura tendem a ser vistas como percepções amáveis ou feias; intuições do moralmente elevado são intuições elevadas. Às vezes o adjetivo vagueia como se não tivesse certeza de onde se fixar. Devemos falar de visões sedutores ou de visões de coisas sedutoras? De desejos perversos ou de desejos por perversidade? De pensamentos saudáveis ou de pensamentos de objetos saudáveis? De bons impulsos, ou de impulsos em direção ao bem? De sentimentos de raiva ou de sentimentos raivosos? Ambos na mente e na coisa, essas naturezas modificam seu contexto, excluem certos associados e determinam outros, possuem seus pares e incompatíveis. Contudo, nem tão obstinadamente como no caso das qualidades físicas, pois beleza ou feiura, amor ou ódio, o prazeroso e o doloroso podem, em certas experiências complexas, coexistir.
Se alguém fizesse uma construção evolucionária de como muitas experiências puras originalmente caóticas gradualmente diferenciaram-se em um mundo interno e externo ordenados, a teoria toda dependeria do sucesso deste em explicar como ou por que a qualidade de uma experiência, uma vez ativa, poderia se tornar menos ativa, e, de ser um atributo enérgico em alguns casos, cairia, em outros lugares, no estado de uma “natureza” inerte ou meramente interna. Esta seria a “evolução” do psíquico partindo do cerne do físico, no qual o estético, o moral e as outras experiências emocionais representariam um estágio intermediário.
VIII
Mas um último grito de non possumus provavelmente surgirá de muitos leitores. “Tudo muito belo, como uma peça de engenho”, eles dirão, “mas nossa consciência em si mesma intuitivamente o contradiz. Nós, de nossa parte, sabemos que somos conscientes. Nós sentimos nossos pensamentos, fluindo como vida dentro de nós, num contraste absoluto com os objetos que acompanha incessantemente. Não podemos ser descrentes dessa intuição imediata. O dualismo é um datum fundamental: não deixe que o homem reúna o que Deus pôs em pedaços”.
Minha resposta a isso é minha última palavra, e lamento grandemente que para muitos isso soará de forma materialista. Não posso evitá-lo, contudo, pois eu, também, tenho minhas intuições e devo obedecê-las. Que o caso seja o que for nos outros, estou tão confiante quanto sou com qualquer coisa que, em mim mesmo, o fluxo de pensamento (que reconheço enfaticamente como um fenômeno) é apenas um nome desleixado para o que, quando escrutinado, revela-se em consistir principalmente do fluxo de respiração. O “eu penso” que Kant disse dever ser capaz de acompanhar todos os meus objetos é o “eu respiro” o qual efetivamente acompanha-os. Há outros fatos internos além da respiração (ajustes musculares intracefálicos etc., sobre os quais comentei em meu Psicologia mais amplo[31]), e isso aumenta os ativos de “consciência”, na medida em que o último está sujeito à percepção imediata; mas a respiração, que sempre foi o original do “espírito”, expirando, entre a glote e as narinas, é, estou persuadido, a essência da qual os filósofos construíram a entidade conhecida a eles como consciência. Aquela entidade é fictícia, enquanto os pensamentos no concreto são totalmente reais. Mas os pensamentos no concreto são feitos do mesmo produto que as coisas.
Eu gostaria de poder acreditar que tornei isso possível neste artigo. Em outro artigo tentarei fazer a noção geral de um mundo composto de experiências puras ainda mais limpa.
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Notas:
[1] Nota do tradutor (N.T.) Equipolente é um termo utilizado em álgebra linear para designar segmentos de reta que possuem mesmo módulo, direção e sentido. Assim, significa no trecho de James que, apesar dessa mudança de nomes, os termos estão voltados a um mesmo objeto.
[2] Nota do autor (N.A.): Artigos por Baldwin, Ward, Bawden, King, Alexander, entre outros. Dr. Perry está, francamente, além da fronteira.
[3] N.T. Cf. Immanuel Kant. Crítica da Razão Pura. Ed. Fundação Gulbenkian Calouste, p. 650
[4] N.A. Em meu “Psicologia” tentei mostrar que não precisamos de outro cognoscente senão o “pensamento passageiro”. (N.T. O livro é “Psychology The Briefer Course”, uma versão condensa dos “Princípios de Psicologia” de James).
[5] N.T. Ou seja, há percepção do fato na consciência.
[6] N.T. “Qualquer discussão que se coloque na perspectiva da Psicologia Analítica a respeito do desenvolvimento da personalidade […] deve começar assumindo o fato de que o que vem primeiro é o inconsciente, e que só depois é que surge a consciência. A personalidade como um todo e o seu centro diretor, o Self, existem antes de o ego tomar, formar e desenvolver-se como centro da consciência; as leis que regem o desenvolvimento do ego e da consciência estão subordinadas ao inconsciente e à personalidade como um todo, que é representado pelo Self”. (Cf. Erich Neumann. A Criança. Ed. Cultrix. P. 10)
[7] N.A. Moore, G. E. The Refutation of Idealism. Mind, Vol. 12., New Series, 1903. p. 450.
[8] N.A. Natorp, P. Einleitung in die Psychologie nach kritscher Methode. Freiburg, 1888. pp. 14, 112 (N.T. “Introdução a psicologia segundo o método crítico”, não há traduções para este livro.)
[9] N.T. Ou seja, um quadro no qual um objeto, cenário, momento, que acontece no mundo foi pintado.
[10]: N.A. “Figurativamente falando, pode-se dizer que a consciência é o único solvente universal ou mênstruo, no qual os diferentes tipos de atos e fatos psíquicos estão contidos, seja em forma oculta ou óbvia”. (Ladd, G. T. Psychology, Descriptive and Explanatory. Charles Scribner’s Sons, New York, 1895, p. 30).
[11] N.T. Tender para fora ou “extensão” e tender para dento ou “intensão”. Ou seja, a relação é uma extensão da experiência considerada.
[12] N.T. James parece fazer alusão a famosa citação de Heráclito “Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio, porque tanto a água quanto homem mudam incessantemente”.
[13] N.T. Terminus ad quem significa “limite até o qual”. Terminus a quo significa “limite a partir do qual”, ou seja, momentos nos quais algo termina e começa.
[14] N.T. Os termos em colchetes foram inseridos para facilitar a compreensão do trecho, deixado um tanto obscuro por James. Para tornar ainda mais claro, James quer dizer que as experiências interna e externa são distintas por suas próprias peculiaridades. Assim, um dado evento na imaginação do leitor seria verdadeiro em termos de experiência interna, mas não para a experiência externa, no quarto. Por isso, James dá exemplos de coisas que poderiam acontecer com o quarto pela mera fantasia do leitor, como um fogo que não queima, mas que algo assim seria impossível na experiência externa, ainda que na experiência interna isso de fato tenha ocorrido.
[15] N.A. Aqui, como em outros lugares, as relações são, naturalmente, relações experimentadas, membros da mesma variedade originalmente caótica de experiência não-perceptiva da qual os termos relacionados em si mesmos são partes.
[16] N.A. Sobre a função representativa da experiência não-perceptiva como um todo, direi uma palavra em um artigo subsequente: ela leva longe demais a teoria geral do conhecimento para que muito se diga sobre ela em um breve artigo como este.
[17] N.A. Münsterberg, H. Grundzüge der Psychologie, Vol. 1. Leipzig: J.A. Barth, 1900. p. 48. (N.T. Não há tradução para este livro).
[18] N.T. James refere-se ao determinismo de Hippotyle Taine, no qual o meio em que o indivíduo vive e seu contexto atual como fatores determinantes à suas ações, de forma que raça, momento e meio seriam fatores determinantes do caráter dos indivíduos.
[19] N.T. Ter em dobro, duplicar. O sentido parece o de “replicar” ou “reproduzir” a experiência adquirida no mundo externo pela imaginação ou pela memória na consciência, como forma de experiência interna. Ainda, como explicado mais a frente por James, o termo “duplicar” é mais preciso em razão de um dizer respeito ao mundo externo (objeto pensado), e outro, duplicado, à réplica, ao pensamento (pensamento sobre um objeto).
[20] N.T. Coupling significa acoplamento, ligação. Utilizamos o termo “associado”, que já configura uma relação com outro objeto, seja uma associação forte ou fraca. Ainda, James citou esses associados anteriormente, cabendo melhor o termo aqui.
[21] N.T. Cf. Josiah Royce, Introduction to H. Poincare, Forrndorions of Science, tradução de G. B. Halsted (New York The Science Press, 1913). Reprinted In Royce’s Logical Essavs, D. S. Robinson, ed., pp. 268-284.
[22] N.A. Cf. Hodder, A. The Adversaries of the Skeptic, New York., 1901, pp. 94-99.
[23] Para simplificar, confino minha exposição à realidade “externa”. Mas, também, existe o sistema de realidade ideal no qual a sala desempenha seu papel. As relações de comparação, de classificação, de ordem serial, de valor, também são obstinadas, atribuem um lugar definido à sala, ao contrário da incoerência de seus lugares na mera rapsódia de nossos pensamentos sucessivos.
[24] N.T. Ou seja, a experiência pura não é dividida entre consciência e objeto de que se está consciente.
[25] N.A. Observe a ambiguidade desse termo, que às vezes é tomado de maneira objetiva e às vezes, de maneira subjetiva.
[26] N.A. Na Psychological Review de julho deste ano, o Dr. R. B. Perry publicou uma visão da Consciência que se aproxima mais da minha do que qualquer outra que conheço. Como presente, pensa o Dr. Perry, cada campo de experiência é “fato”. Torna-se “opinião” ou “pensamento” apenas em retrospecção, quando uma nova experiência, pensando o mesmo objeto, o altera e corrige. Mas a experiência corretiva torna-se, por sua vez, corrigida, e assim a experiência como um todo é um processo no qual o que é objetivo originalmente se torna subjetivo para sempre, transforma-se em nossa apreensão do objeto. Eu recomendo fortemente o admirável artigo do Dr. Perry para meus leitores. (N.T. O artigo citado por James: Perry, R. B. (1904). Conceptions and misconceptions of consciousness. Psychological Review, 11(4-5), 282–296.)
[27] N.A. Apresentei um relato parcial do assunto em On the Function of Cognition. Mind, vol. 10., p.27, 1885, e no The knowing of things together. Psychological Review, vol. 2., p. 105, 1895. Ver também artigo A naturalistic Theory of the reference of thought to reality de C. A. Strong no Jornal of Philosophy, psychology and Scientific Methods, vol. 1., p. 253, 12 de maio de 1904. Espero muito em breve voltar a abordar o assunto nesta revista. (N.T. Os nomes dos artigos foram inseridos assim como foi corrigida a revista em que o segundo artigo citado foi publicado).
[28] N.T. Cf. Shadworth Hodgson. The Metaphysic of Experience. Vols. 1-4.
[29] N.A. A prova de Spencer de seu “Realismo Transfigurado” (sua doutrina de que existe uma realidade absolutamente não-mental) vem à mente como um exemplo esplêndido da impossibilidade de estabilizar a heterogeneidade radical entre pensamento e coisa. Todos os seus pontos de diferença acumulados dolorosamente encontram-se gradualmente em seus opostos e estão cheios de exceções. (N.T. sobre o artigo de Spencer: Cf. Spencer, H. (1897). Transfigured realism. In H. Spencer, The principles of psychology, Vol. 2-2 (pp. 489–503). D Appleton & Company).
[30] N.A. Falo aqui da vida interior completa, na qual a mente brinca livremente com seus materiais. É claro que o jogo livre da mente é restrito quando procura copiar coisas reais no espaço real.
[31] N.T. James provavelmente faz referência a seu livro “Princípios de Psicologia”.
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